Conversando sobre uma tia do
meu marido que está muito acabadinha, perguntei se ela era mais nova que a mãe
dele, que já morreu.
- Não sei. Talvez meu pai saiba responder isso; duvido que meus irmãos
saibam. Lembra que você que elucidou quando que ela morreu? A data da morte
dela?
- Eu? Mas isso não foi checado em algum documento?
- Não, pra você ver como que está a Igreja.
-Tá vendo? Isso parece até que foi uma resposta do além. Sempre tive um
"feeling" de que poderíamos ser amigas, minha sogra e eu; lamento não tê-la
conhecido.
Foi assim...
Há uns anos, por ocasião do
enterro de uma outra tia – família antiga, numerosa –, ao abrirem o túmulo onde
seria inumada, no pequeno cemitério da Paróquia de sua cidade natal, lá estava
uma urna que seu irmão, presente ao evento, foi logo reconhecendo e anunciando,
em voz alta, que era de sua mãe. O imprevisto causou sobressalto e exclamações
entre os familiares que ali estavam, consternados por mais aquela perda, cuja
lembrança o tempo já havia cuidado de esconder em alguma gaveta do passado. Meu
cunhado quase se arrependeu de ter-se manifestado, também pelo que sucedeu logo
após.
Terminados os trabalhos e
orações,
o padre convidou-o ao presbitério, para verificar se os livros de registros
paroquiais estavam em dia, pois não se lembrava de ter anotado esse óbito e já
havia algum tempo que não tinham pessoal trabalhando na secretaria da paróquia
– as finanças das igrejas católicas na província do Québec vão de mal a pior, é
cada vez menor o número de fiéis e colaboradores. De fato, não havia nenhuma
anotação sobre a finada.
O cunhado ficou apertado,
pois não se lembrava da data de morte da sua mãe.
- Só um minutinho, Padre, vou telefonar para o meu pai e resolvemos isso
num átimo.
O pai também não se lembrava
e, com a mudança de casa, perdera muita coisa. Talvez, até tivesse ainda alguma
documentação, mas sua filha tinha compactado e empacotado tudo, o que significava caso perdido para ele,
já na casa dos 90 anos de idade; impossível achar alguma coisa naquele
sumidouro.
Telefonou, então, para cada
uma de suas irmãs e, finalmente, para seu irmão, meu marido, já sem esperanças,
pensando que teria que ir atrás do serviço de incineração ou sabe-se lá em que
repartição pública, para procurar por algum documento.
- Estou telefonando por desencargo de consciência, mas imagino que você
também não saiba qual a data da morte de nossa mãe.
- Para que diabos você quer saber a data da morte da mamãe? Sei lá, eu!
Ao ouvir a conversa, entrei
em cena, eu que sequer tinha conhecido minha sogra.
- Eu sei.
Meu marido, entre incrédulo
e perplexo: - Como assim, você sabe?
- Maria está aqui dizendo a data.
- Mas como ela sabe?
- Como você sabe?
- Ela morreu no mesmo ano em que me mudei para cá, antes que eu a
conhecesse. E foi no dia do aniversário de um dos meus irmãos. Assim, a data ficou marcada na minha
memória.
Pronto, o Padre confiou na
informação obtida por telefone, vinda quiçá das fronteiras do além, fez o
registro e deu por encerrado o problema. Afinal, eu, que só cheguei a ver a
urna funerária da sogra, de longe, no dia do enterro, posso dizer que tive
alguma participação na vida dela... post mortem.
Que Deus a tenha em bom
lugar. Descanse em paz.
Nenhum comentário:
Postar um comentário