quarta-feira, novembro 19, 2014

Hino à Bandeira: pronto, chorei

Link para o Hino à Bandeira:



Mesmo quando tudo vai bem, eu choro ao ouvir os hinos brasileiros. Hoje, Dia da Bandeira, não podia ser diferente. E com mais razão ainda para chorar, porque o Brasil está passando por uma fase complicada, difícil de compreender. Como é que deixamos a situação degringolar dessa maneira? Estamos perdendo a dignidade, infelizmente.
O capítulo, ou melhor, os capítulos da corrupção seriam já mais que suficientes para nos causar profundo desgosto. Mas vejo que estamos nos deixando levar por graus de tolerância inverossímeis que, estes também, tangenciam a corrupção moral. E, nesta onda de indulgências, estou tendo condescendência no uso do vernáculo, pois que poderia usar termos mais fortes, indignados, desiludidos, chocados, porque a situação - verdade seja dita - não tangencia mas desaba em obscuros abismos, com uma força gravitacional que ultrapassa os limites da normalidade.
As leis no Brasil têm-me deixado boquiaberta. Como é que se oferece ao prisioneiro algo como “delação premiada”? Que justiça sem vergonha é esta? Na minha opinião, o preso, julgado e condenado, já tem o seu cabedal de culpas, merece a sentença que lhe couber, sem subterfúgios. Pois aplicam-lhe uma vergonha a mais: a de ser delator, em troca do prêmio de sair da prisão mais cedo, como um verme que corrói sua própria alma. Não sou contra benefícios que possam ser dados aos presos, mas por virtudes, não por mais um ato abjeto - esse de barganhar seu depoimento. Que é isso? O objetivo da prisão não é tentar recuperar o cidadão para viver em sociedade? Então, ele tem que cumprir a sentença que lhe foi dada, independentemente de ter, também, que dizer a verdade, de depor sobre o que sabe. Que justiça preguiçosa é essa, que não é capaz de fazer a investigação adequada, com inquéritos e buscas de provas inteligentes para capturar os bandidos? Que o preso declare o que tiver que declarar - não em troca de benesses. Que justiça é essa que usa o suborno e legaliza esse ato desprezível? Suborno também é corrupção!
Outro absurdo, a meu ver, é a lei que diz que ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo. A partir daí, dá-se o direito ao criminoso de recusar vários tipos de técnicas que levariam a comprovar sua culpa. Isso não tem pé nem cabeça! Sem nexo e favorecedor de impunidade.
Essas coisas me parecem tão estapafúrdias que tenho a impressão de estar em alguma outra dimensão... Sei lá. Sinto-me no dever de, pelo menos, escrever este texto, já que estou longe, em outras latitudes – quem sabe, consigo atingir o meu amado país com um sopro de dignidade. É preciso aprender com as letras dos nossos hinos, precisamos nos educar de novo, pois estamos perdendo nossos valores morais.
“Contemplando o teu vulto sagrado,
Compreendemos o nosso dever,
E o Brasil por seus filhos amado,
poderoso e feliz há de ser!”

domingo, novembro 09, 2014

Novembro

Version en français
English version

Nunca me esqueci daquelas palavras de uma tia do meu marido, no primeiro outono que passei aqui no Canadá: “Je déteste le mois de novembre, c’est le pire mois de l’année”.
No início, quando tudo era novo para mim, achei que ela exagerava. Apesar de toda a burocracia que tive que enfrentar e despesas que as mudanças de estado civil e de país me custaram – um verdadeiro turbilhão de providências a tomar – eu estava encantada com tudo, porque o amor nos faz vencer todos os obstáculos. Não seriam 30 dias que iriam ofuscar a minha alegria. Naquele ano, tivéramos um verão ensolarado e muito quente, o hemisfério norte fora generoso ao me receber calorosamente, à altura da minha tropicalidade. O outono se seguiu com toda a beleza das folhagens em cores fulgurantes, um espetáculo que eu conhecia somente de fotografias ou pinturas. Em seguida, as folhas caíram, “comme il faut”, como aprendemos na escola, mas não temos a oportunidade de testemunhar com a mesma magnitude em nossos "paraísos tropicais". Um curto “Été des Indiens” marcou presença, antes que o inverno viesse me encantar, com todas as surpreendentes variedades de estado da água – também minha primeira vez a testemunhar estas várias e caprichosas formas da água em estado sólido, desde os lindos e silenciosos cristais de neve em flocos, até o temido “verglas”, aquela chuva se congelando e se acumulando como cola nas superfícies. Sem falar do frio glacial que me fez aprender rituais e gestuais nunca dantes imaginados – roupas e até mesmo maneiras de caminhar.
Passados os anos, fui-me acostumando, mas nunca como os nativos dessas latitudes. Guardo um certo respeito e, por que não dizer, medo desses estados de humor da natureza, nem sempre favoráveis.
Agora, começo a dar razão à tia – ma chère tante Rachel – que, com seus 76 anos de vida nesse clima (hoje ela está com 91 anos), confessara-me seu descontentamento com o dito mês. Sim, é o pior de todos. A obscuridade dos dias, cada vez mais curtos, torna-se mais evidente, o verde permanece só nas árvores coníferas – um verde sem muito vigor nessa época. As aves migratórias já partiram para o sul,  insetos e aranhas entram nas nossas casas, em busca de abrigo, o canto dos passarinhos silencia.O vento corre solto e frio, anunciando que o inverno não tardará.
Que venha, então, a neve para apagar todas essas sombras que querem se apoderar de nós. Que venha refletir as nossas luzes e clarear nossos caminhos. E quando dezembro chegar, nossa esperança se renovará, a luz do dia começará a se prolongar. Celebraremos o presente da VIDA de novo. Que venha o Natal!