segunda-feira, setembro 24, 2018

Aniversário de casamento


Completamos 19 anos de casados. Nosso casamento foi um tanto folclórico, primeiro porque nos conhecemos já "idosos" e nos casamos o Léo com 51 e eu com 44 anos. Fez um calor de rachar! O noivo queria ir de bermuda, eu que não deixei. Mas foi de sandália, daquelas mais fechadas, mas sandália. E ficou bem contente quando viu que o padre também estava usando, e bem parecidas com as dele. A camisa era cor de rosa, de mangas curtas, calça branca e a gravata com um violino estampado.
Fui vestida sobriamente, com uma linda blusa em crochê que ganhei de minha cunhada, Sarah, e uma saia que comprei por aqui mesmo, tudo num tom bege bem clarinho, como um linho cru quase branco, os sapatos da mesma cor. O colar que usei me foi emprestado por outra cunhada, Clélia. Os outros acessórios eu já tinha, brincos de pérola, anel de noivado na mão direita e só. A maquilagem, eu mesma fiz. Um bom bronzeado não podia faltar, testei o verão nórdico, em preparação para o dia, e obtive bom resultado, para bem representar o meu Brasil, nesse quesito, e a roupa branca ajudou no contraste.
Nada de véu e grinalda, não conseguia imaginar-me assim. De véu já bastaram os que usei na infância – sim, eram obrigatórios na igreja, naquele tempo. Usei meus cabelos mesmo, num coque simples, um pouco mais elaborado do que aquele que eu costumo fazer, pois minha cunhada me ajudou. Mas já fui logo avisando que não queria coque de “Miss Venezuela”. Não sei se ainda há Miss Venezuela, do jeito que o país vai mal, hoje em dia, mas as moças lá são muito bonitas. No meu caso, não sendo nenhuma “Miss Brasil”, quanto menos chamasse a atenção, melhor.
Uma prima, Lurdinha, tinha me emprestado um vestido lindo dela, para que eu usasse no casamento. Mas, após um mês de Canadá, eu não cabia mais na roupa. Soube de gente no Brasil que, ao ver o filme e as fotos do meu casamento, pensou que eu estava grávida. Não é que eu estivesse gorda, é que estava bem magra antes, e a mudança nos horários e tipos de alimentos pesou na balança.
Fizemos tudo da maneira mais simples possível, não tínhamos contratado nenhum fotógrafo nem cineasta... e tivemos dois filmes ótimos e fotos de todos os ângulos possíveis e imagináveis. Minha mãe e minha irmã tinham pedido muito que filmássemos, pois elas não poderiam vir. Então, tudo de improviso, ao chegar na igreja, Léo entregou sua câmera a um amigo e pediu para filmar. O outro filme foi meu concunhado que fez.
Os amigos do Léo fizeram questão de registrar o evento com fotos, pois ninguém imaginava que ele se casasse um dia, muito menos na igreja, menos ainda com uma brasileira. Casar e mudar também não estava nos meus projetos e, afinal, acabei "desencalhando". Meu irmão, Chico Lima, e minha cunhada, Clélia, foram meus padrinhos de casamento, eram os únicos brasileiros presentes. Eles também tiraram ótimas fotos.
Uma coisa que me deu um susto – bom, diga-se de passagem –, logo na chegada, foram os sinos tocando. Aqui é de praxe, quando a noiva chega. Nós chegamos juntos, achei ótimo. Não foi a chegada da noiva que foi aguardada, foi a do pai do noivo, que acabou não aparecendo.
Quando voltamos da igreja, alguns de nossos vizinhos estavam nas laterais da rua, cada qual na frente da sua casa, acenando com lencinhos para o carro onde estávamos e o cortejo atrás, buzinando... Foi “buzinaço” intermunicipal, desde a cidade de Saint-Pie até chegarmos em casa, em Acton Vale.
Os convidados foram poucos, só parentes próximos e amigos mais chegados do Léo. O méchoui que ele encomendou estava uma delícia, muito bem servido. Uns músicos da vizinhança vieram tocar à noite, eles que se ofereceram, fomos de sorte! Foi uma festança ao ar livre até de noitão, com fogueira e muita alegria.
Hoje, revendo as nossas fotos, fiquei pensando como o tempo passou depressa mas, sob outro aspecto, como esse passado está tão longe. Como dizem aqui, “pas drôle vieillir”, mas pode ser bom também.
Como todo mundo, passamos por alegrias e tristezas, por dias mais difíceis, outros mais fáceis. Uma de minhas cunhadas canadenses já me perguntou, várias vezes – este ano de novo – qual é o segredo para manter o casamento por tantos anos. Não sei, não tenho nenhuma receita mágica, nunca respondi, mas isso me fez refletir. A primeira coisa que me ocorre é que aprendi muito e continuo aprendendo com a vida a dois.
Penso que nos ingredientes da receita deve haver amor, amizade e humor, com respeito mútuo e compromisso com a verdade – sempre; sem faltar romantismo e sensualidade, obviamente, isso não tem idade. Bater, nem no homem nem na mulher, sequer com uma flor – nunca, au grand jamais! Não consigo me imaginar numa situação dessa, seria o fim de tudo, imediatamente. É preciso ter ajuda mútua, cada um cedendo um pouco aqui e ali. Uma boa pedida também é praticar aquele velho e sábio ditado: “Quando um não quer, dois não brigam”, à chacun son tour. Melhor ser o primeiro a calar a boca e, quando os dois usam a técnica, às vezes dá um silêncio... Depois que baixar a poeira, é bom não deixá-la ali muito tempo, que o vento pode levá-la, e é a gente que tem que fazer a faxina – não usar palha de aço, pode arranhar para sempre.
Dito assim, parece fácil. Não é. Tudo tem que ser cultivado para crescer e se tornar grande. Tem-se que aprender a conjugar o verbo perdoar em todos os tempos e modos. Conseguir essa façanha é muito gratificante e resulta em incontáveis benefícios. Pronto, cá estou eu a dar conselhos para casais. Desculpem-me. Cada um sabe o que é melhor para si mesmo, não é? E o melhor para uns pode não ser para outros. Penso que vou continuar sem responder à pergunta da minha cunhada.
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L'amour est bleu 

20e anniversaire de mariage (em francês)

sábado, setembro 22, 2018

Espirros, risadas e latidos



Podemos até pensar que fazemos o que bem entendemos, mas nem sempre ouvimos o que entendemos, muito menos entendemos o que ouvimos. Pronto, já me confundi toda. O jeito é rir. E para rir por escrito, em português do Brasil, já não se usa muito o famoso riso anserino quaquaquá. Mas continuamos navegando nas ondas da moda.
O usuário de redes sociais está todo risos em versão abreviada – rsrsrs,  ou onomatopeica – kkkkkk; esta última bastante perigosa se formos econômicos no número de letras k, deixando só três, por exemplo; pessoas de outras línguas poderão não achar muita graça. Um amigo de rede social já me perguntou, certa vez, porque meus amigos brasileiros repetiam tanto a sigla daquela organização supremacista branca americana.
Ainda há os mais antigos na internet, como eu, que optam pelos hehehe ou hahaha, sem esquecer o famoso “LOL” – “laughing out loud” explicando para quem pegou o bonde andando, sem saber onde cantava o galo. Mas tudo isso tende a ficar obsoleto, para dar lugar às inúmeras imagens icônicas.
Muito interessante também é a interpretação dos latidos de cães. Aqui no Canadá, eles fazem "woof, woof". No Brasil é "au, au". Em Portugal é “ão, ão”; saudações ao português Francisco Santos, que explicou isso muito bem: “Em Portugal é ão, ão, sem dúvida. Até porque o animal chama-se cão. O cão faz ão, ão :-)”.
Uma amiga chinesa disse que na China eles fazem "uã, uã"... Se repetir muitas vezes, fica igual ao cachorro português. Torna-se imperativo que latam, por favor, e constatarão. Como tem mais chinês que tudo no mundo, ganharam o “dog voice” os cães chineses e portugueses por maioria absolutíssima... cain cain cain
Mas para espirrar é que são elas. Devo confessar que não consigo espirrar em francês, que é a língua que falamos em casa. Já tentei, em vão. Acho tão engraçado o som do espirro ser diferente conforme a primeira língua que falamos. [1] Quando eu espirro, meu marido morre de rir e diz que eu falo "catchim". Sempre achei que eu espirrava "atchim"... hahaha. Os francófonos espirram "atchoum" (som de 'um' no final).
Mas nem sempre fala-se alguma coisa ao espirrar. Na casa de meus pais, a ala feminina esteve bem representada com gradações de espirro de um extremo a outro. Minha mãe, quando espirrava, parecia que uma porta tinha batido com a força de uma ventania (observação do meu pai); nem "atchim", nem nada que se pareça com alguma representação fonética. A gente levava muito susto, era forte. Não dava para ver ainda bem mas o que era para ser posto para fora, devia ser eliminado no ato. Acho que é por isso que ela raramente tinha gripes ou resfriados (este é um comentário puramente leigo). O meu espirro é um "mini" do da minha mãe, mas para quem nunca ouviu o dela, dá para causar sobressalto.
Minha irmã não emitia som algum: o extremo oposto da minha mãe. A gente só sabia que ela tinha espirrado, porque não sei quando, alguém perguntou o que era aquilo e ela contara que era um espirro... hahaha. Não estou exagerando, ela só fechava os olhos e dava um discreto arranco com o tórax. Se eu tentar fazer isso, sai pelos tímpanos, com perfuração total, bilateral.
Não posso me esquecer deste: disse um amigo que mora na Inglaterra (alô, João Magalhães) que o espirro dos escoceses tem o som "whiiiiskey" :-).
Não é o meu caso, mas já imaginou você em um outro país, falando perfeitamente um idioma, como um nativo, satisfeito por ninguém perceber que você é estrangeiro, e vem aquele espirro inesperado... Duvido que alguém consiga disfarçar. Nem um “brasilianista” (isso ainda existe?) dos mais treinados vai conseguir me enganar com um “atchoum”... Ah, isso é que não.

[1] https://pt.wikipedia.org/wiki/Espirro#Em_outros_idiomas