sexta-feira, julho 31, 2015

Flox e Singles K, lá e acolá

Publicado também pela KBR Editora Digital, em 1º de agosto de 2015

http://www.kbrdigital.com.br/blog/flox-e-singles-k-ca-e-acola/
e
https://www.cronicasdakbr.com/2015/08/01/flox-e-singles-k-ca-e-acola/

Já são cem singles K, cem livros de crônicas da KBR Editora, em cem semanas! Sem cessar! Um desafio enfrentado com criatividade, espírito crítico, humor e disciplina por uma equipe determinada e talentosa, transestatal e transnacional, sob a liderança da Nossa Star, digo, Noga Sklar! Os textos encontram seu destino onde quer que esteja a nossa Editora, nesse admirável mundo virtual, e dali partem para o público, após o devido processamento. Tenho muito orgulho de participar desse time que joga para ganhar... Já festejando 100 gols! Sim, gols cá, lá e acolá, vindo de toda parte, indo para todo lugar! 

Uns estão na peleja desde o início, outros chegaram mais tarde, como eu. Não consigo exprimir quanta emoção foi para mim ter sido convidada a entrar para o grupo. Sempre tenho algum receio de não estar à altura da empreitada e isso se transformou num estímulo para me esforçar e contribuir com o melhor que posso. Tenho aprendido tanta coisa escrevendo essas crônicas semanais, que me sinto imensamente recompensada e só tenho que agradecer por poder fazer parte desta equipe dinâmica e competente. 

Este modelo semanal ou quinzenal de escrever com o compromisso de fornecer matéria para publicação, nos faz exercitar nesta arte tão elevada que é a escrita. É uma atividade deliciosa, que nos mantém em dia com os fatos, ao mesmo tempo que nos incentiva a refletir, a burilar nossas ideias para transmiti-las aos outros. Escrever é algo fascinante. O que fica registrado estabelece uma espécie de sinapse entre neurônios de pessoas diferentes, atuais, futuras e de vários lugares. É a comunicação atravessando os séculos e os quilômetros, deixando vestígios da vida humana e sua evolução, e com o potencial de influenciar quem lê. É mais importante do que a gente calcula!

Hoje, estamos nos contorcendo de aflição e preocupações com o presente e o futuro do Brasil. Oxalá os problemas se dissipem em breve e permitam à pátria amada ser  mãe gentil para todos os brasileiros. Quando, num melhor porvir, lerem nossas crônicas cheias de apreensões e de denúncias do que pensamos estar errado, saberão da gravidade dos acontecimentos desta época e que lutamos de alguma forma para combater os males, mesmo alguns de nós estando longe do país.  

Também fora do Brasil, as coisas não vão nada bem. O mundo está muito conturbado, não se valoriza tanto mais a vida, não só a humana, mas do planeta inteiro. Tantos horrores sendo cometidos e banalizados, tanta ganância, tanto imediatismo... Quando tentamos procurar outros assuntos, em outros lugares, tentando nos afastar de nossas preocupações diárias, nos deparamos com situações dantescas, nem um pouco tranquilizadoras. Às vezes, ficamos tão desiludidos, que falta inspiração para escrevermos nossos textos: dizer o quê? Perdemos a graça.

Vou confessar uma coisa que podem até pensar que é “puxa-saquismo” – e pode até ser – mas é a pura verdade: muitas vezes, eu me motivo lendo os textos e frases da nossa “star” Sklar, tanto em suas crônicas, quanto nas redes sociais, com sua sagacidade e humor inteligente, sempre deixando transparecer um ânimo inabalável. E digo a mim mesma: vou tentar “noglar”, eis aí um verbo que inventei e que uso frequentemente.

Além de editar os textos das crônicas, dos livros, com esmero, conhecimento e sabedoria, além de escrever também e tão bem, ainda fazendo todas essas mirabolâncias com as produções digitais etc etc etc, não sei como consegue estar sempre de bom humor e não ficar exausta. Hats off

As flores do meu jardim hoje, esses lindos flox, são para ela, assim como para todos os escritores desse time de sucesso. Por favor, aceitem esse presentinho que escolhi com muito cuidado: é o buquezinho mais lindo e o mais perfumado... Só não faço minhas as “mal traçadas linhas” – que tentação! – senão a Noga mete bronca na correção, sempre justa e democrática, diga-se de passagem.

Quero felicitar a todos pelo ótimo trabalho, faço questão de sempre ler as crônicas. Como já disse, tenho aprendido muita coisa! Que possamos continuar a “noglar” por muito tempo, e que muitos outros centos venham!!!

sexta-feira, julho 24, 2015

Falando em bullying...

Para dizer a verdade, estou desanimada de acompanhar a já longa e constante avalanche de más notícias do Brasil, no que diz respeito à corrupção, à educação, à segurança, à política, à economia e tudo o mais. Estou me sentindo abafada pelas toneladas de decepções que estão nos esmagando, isto parece um pesadelo sem fim. São tantos despautérios que são falados e postos em prática pelos nossos governantes e políticos, que chega-se a duvidar da inteligência ou da sanidade mental deles. Chego a ter a impressão de que tudo é um complô para ensandecer o povo que, no final das contas, literalmente, paga pelo prejuízo moral e financeiro de que ele próprio foi e é vítima.

A gente precisa tentar consertar o Brasil com bom senso, eficiência e democracia. O que estamos presenciando é uma farsa. Enquanto houver sintomas de populismo, enquanto o povo estiver sendo assaltado por tantos tipos de crime que, apesar do espalhafato, continuam muitos na penumbra e impunes, enquanto isso não acabar,  não haverá a ordem e o progresso que todos desejamos. 

É realmente um teatro de absurdos o que está se passando, e as pessoas já estão começando a se descontrolar mais seriamente. Estão a rosnar umas para as outras, como disse um artigo que li recentemente que, também ele – o artigo – rosna alto, além de exalar o mau cheiro da morte, numa espécie de genocídio do povo brasileiro, através de palavras que chicoteiam o estado psicológico de quem já está combalido. Esse artigo parece realmente escrito por alguém que está cooptado, com o intuito de instalar o caos completo, a partir do qual qualquer um faz o que quiser, com o abuso de autoridade que bem lhe aprouver. Não vou citar o nome do autor nem do jornal, pois achei o texto tão contraproducente que não serei eu que encaminharei mais vítimas à imolação. 

Destruir o que há de positivo na autoimagem coletiva de um povo é técnica para desestruturar ainda mais um país que já está em frangalhos. Estão querendo levar todos ao desespero? Isso cheira a uma artimanha para não deixar pedra sobre pedra e criar um novo conjunto de ideias artificiais e falsas, que possam ser controladas ao bel prazer de quem está no poder. Frases que se estruturam nitidamente para serem convincentes e que denotam a ação de uma intelectualidade intencionada a iludir muitos ingênuos idealistas, mas que são palavras claramente a serviço do poder, não do povo.

Falar em autoritarismo de quem está se opondo ao descalabro que estamos presenciando é, no mínimo, ridículo, até depõe contra a dita intelectualidade. Tem razão quem está se manifestando contra essa doença que acometeu os dirigentes do nosso país. Está mais que provado que há um ninho de serpentes envenenando e devorando a nação. As pessoas corajosas que estão dando alento ao povo são as que ousam enfrentar esses bandidos. Isso não é autoritarismo, é revolta! Mesmo o mais cordato dos cordiais tem o direito de se rebelar contra o seu próprio massacre. E olha que o povo nem está realmente se rebelando, está apenas gemendo, esmagado; às tontas, mal dirigido, tem estado com os nervos à flor da pele, naturalmente, em consequência do desgoverno da nação.

Por outro lado, tem gente rosnando mesmo e temos ouvido alguns berros vindos de vários lados; gritos loucos, roucos e tantos outros... nos microfones e fora deles. Minha mãe diria: "Quem grita perde a razão". Temos que pensar e agir com serenidade e firmeza. Não podemos nos deixar levar por “clichês”, estes sim, que querem exterminar até mesmo as boas qualidades do brasileiro, atribuindo a todos as características malévolas que estão fazendo manchete nos jornais e redes sociais, numa espécie de lavagem cerebral, querendo fazer as pessoas acreditarem que têm valores que não são seus.

Não é hora de massacrar psicologicamente, ainda mais, um povo que tem grande parcela honesta, que trabalha e que sustenta o país (notem bem que não estou reduzindo ninguém a nenhuma classe) e que vem sendo roubada há tanto tempo, culminando com o desastre que estamos vivendo atualmente. 

Por favor, não dêem crédito a quem só vê e propala defeitos em todos os brasileiros. Não é nos deixando pisotear por quem quer que seja, como se pisa num toco de cigarro, para apagar o que já está perto do fim, que vamos conseguir levantar o Brasil.  Não é fazendo nem aceitando bullying com o povo que conseguiremos que ele evolua e seja feliz. 
E, toda atenção é pouca, o campo parece estar minado. Muito cuidado ainda com uma nova modalidade de conchavo que está querendo brotar do lodaçal: parece ser flor que não se cheire!

Publicado também pela KBR Editora Digital, em 25 de julho de 2015:

https://www.cronicasdakbr.com/2015/07/25/falando-em-bullying/

sexta-feira, julho 17, 2015

Batuque no jardim

Version en français

Também publicada na KBR Editora Digital, em 18 de julho de 2015
https://cronicasdakbr.kbrinternational.org/2015/07/18/batuque-no-jardim/
http://www.kbrdigital.com.br/blog/batuque-no-jardim/
e
https://www.cronicasdakbr.com/2015/07/18/batuque-no-jardim/


Não sei se é por ter completado mais um decênio de vida, ou se esse negócio de lembrar do passado é coisa de expatriado. Talvez seja por ter encontrado tudo tão mudado, em recente viagem à terra natal. "Mas que bobagem, isso é natural..." 

Não vou dizer que é porque estamos no verão, que este ano está estupendo aqui no Canadá; também não vou dizer que é porque gostaria de estar lá... Não, sobretudo neste ano de 2015 d.C., o Brasil está refratário à ordem e ao progresso, está de dar medo, confesso. Só mesmo família e amigos para me motivarem a visitar a terrinha. E esta saudade eu bem posso cultivar, ela é minha... 

Cuidando do meu jardim, uma flor ou outra me transporta no tempo, de vez em quando, pelo poder dos aromas. Cheiro é coisa difícil de descrever, mas a gente lembra. Havia perfumes em certos bairros de BH, provenientes de não sei que planta. Cheiro de árvore mesmo. Podiam me vendar os olhos que eu saberia onde estava. 

Ah... as florinhas de abril tão amarelinhas! Dignamente agrestes, cheiravam a mato mesmo, e brotavam em qualquer lugar: nos barrancos, nos lotes, nos morros, no quintal, na rua... Douradamente amarelas, como se fosse o sol derramado e esparramado.

Mas nem estava pensando em nada disso, quando um vento por acaso vindo do sul, em rajadas, trouxe um som antigo de uma escola de samba que ensaiava na favela do “Morro do Pau Comeu”, em Belo Horizonte. O batuque ficava fraco, sumia, depois ficava mais forte de novo, ao sabor das baforadas do ar. Aquele barulho às vezes atrapalhava, tirava a concentração; mas quase sempre eu entrava na cadência, mentalmente, sem perceber. Era assim quase o ano inteiro, o ritmo em modo subliminar, marcando para sempre minha alma brasileira. 

Interessante como há registros latentes em nosso repertório de memórias, oriundos de eventos e sensações que contribuíram para nos moldar, sem que nos déssemos conta disso, e que, volta e meia, tornam a fustigar nossas emoções e pensamentos, reavivando afeições, revelando nossas feições. 

Pois o som daquela bateria, que há tantos e tantos anos não ouvia, estava em algum recanto dos meus guardados, pronto para sair a qualquer momento, sambando em pleno território canadense.

Num gesto instintivo mais forte que a razão, desviei os olhos para o lado de onde vinha o vento, como se fosse ver algum passista com suas acrobacias, ou uma porta-bandeira emplumada e graciosa a rodopiar, surgindo através da vegetação exuberante que nos cerca nesta época do ano. As árvores pareciam embaladas pelo ritmo, talvez estivessem escondendo seus tambores em suas folhagens abundantes.

Sem anúncio alusivo nem grito de guerra, comecei a gingar e ensaiei alguns passos, como uma tresloucada. Sem poder associar minha mise-en-scène à sonoplastia que me inspirava, meu marido não pôde resistir ao ímpeto de rir, com um certo ar desconfiado, diante daquele súbito gestual... Seria algum ritual primitivo que eu ainda não tinha lhe revelado que costumava praticar? 

Para que o efeito observado nele não causasse alguma consequência irreversível, rapidamente perguntei sobre a origem daquele barulho. Foi aí, então, que ele reconheceu a dança que, pelo menos, acompanhava o ritmo. Claro que já tentei sambar muitas outras vezes, mas sempre acho que meu jeito é um tanto acaboclado, provavelmente como eu e minha brasilidade, que mistura tudo; lembra um pouco, talvez, a dança indígena para chamar chuva, sei lá. Bem que minhas plantinhas estavam precisando de uma chuvinha...

Os tambores ritmados que ouvíamos vinham de uma velha enfardadeira[1], que estava sendo usada numa fazenda dos nossos arredores. Trata-se de uma espécie de trator com dispositivos para comprimir o feno, produzindo os tradicionais fardos em forma de paralelepípedo ou cilindro, que são assim recolhidos. É um trabalho duro – carregar fardos não é fácil. Mas são boas recordações da sua juventude quando, junto com a família e amigos, meu marido enfrentava a labuta diária da fazenda, antes de tomar outros rumos na sua vida. Apesar de não haver muitos momentos de descanso, eram atividades saudáveis, uns ajudando os outros na sobrevivência. Agora existem maquinarias que fazem praticamente todo o trabalho, porém alguns poucos remanescentes dos antigos tratores ainda continuam em uso.

Vivendo aqui, venho aprendendo muita coisa sobre o Canadá, vou me inteirando da História deste país. Acho tudo muito interessante para ampliar meu conhecimento, sem ficar olhando só para o meu próprio umbigo brasileiro. A gente passa a compreender melhor como é que “assim caminha a humanidade”. Por isso, partilho esses traços de cultura com meus leitores e espero que não seja inútil. 

De lá para cá, do nosso tempo de juventude até os dias de hoje, tanta coisa mudou! Embora nem sempre para melhor, não podemos negar que houve algum desenvolvimento e que a vida ficou melhor em muitos aspectos. A tecnologia, por exemplo, ajudou bastante. Sem ela, não poderia estar expondo aqui minhas palavras e meus sentimentos, que ficarão, como tantos outros, disponíveis para quem quiser ler e, quem sabe, encontrar neles alguma graça ou utilidade. 

Não podemos desanimar, não podemos deixar o samba morrer. Faço a minha parte, prometo nunca mais tentar sambar.

sábado, julho 11, 2015

E a caravana passa...

Também publicado pela KBR Editora Digital:
https://cronicasdakbr.kbrinternational.org/2015/07/11/e-a-caravana-passa/
http://www.kbrdigital.com.br/blog/e-a-caravana-passa/
e
https://www.cronicasdakbr.com/2015/07/11/e-a-caravana-passa/



Aquela tarde de verão parecia infinda. Felizmente, sombra e Wi-Fi não me faltavam na pracinha movimentada do shopping, enquanto esperava meu marido. Tínhamos combinado de nos encontrar ali, após minha caminhada pela “Route Verte La Campagnarde”,  e eu chegara mais cedo do que previsto. 

De um ângulo de observação por acaso estratégico, a cada vez que tirava os olhos do meu “dispositivo móvel”, eles se viam diante de uma senhora atenta ao seu tablet, sentada num banco bem vis-à-vis ao meu, em meio ao vaivém da turba. Tive a impressão de já tê-la visto antes, provavelmente também na sua andança pró-saúde. Sim, era ela com quem cruzara, dias atrás, no caminho que faço; tínhamos até trocado alguns comentários banais sobre o clima – o assunto “oficial” do Canadá. 

Sentadas ali naqueles bancos daquela tarde de verão, estávamos como que ausentes, com nossas engenhocas ligadas aos nossos espaços virtuais. Interessante como a tecnologia da comunicação colocou o mundo inteiro conectado, cada um tentando povoar a sua solidão. 

Quase sem tirar os olhos do seu tablet, de vez em quando ela mordiscava algo parecido com uma barra de cereais. Com indumentária e calçados esportivos, cabelos castanhos, com a cabeça baixa, era difícil precisar sua idade. Mas tendo visto seu rosto de perto, eu sabia que parecia ter uns 50 anos, ou até mesmo 60... Como eu.

Na nossa idade, muita coisa vivenciamos neste mundo, presenciamos grandes mudanças no pensamento e no comportamento humano dito ocidental. Mas, ao contrário do que muitos dizem, penso que sempre houve mudanças significativas, isso não é privilégio dos nossos tempos – cada evolução com a devida repercussão nos costumes de cada época. Porém, não arrisco opiniões sobre outros povos “não ocidentais”. Não tenho conhecimento suficiente sobre o assunto.

Vendo aquela senhora, ali diante de mim, com uns ares de mulher realizada e independente, me veio à mente um artigo que li há pouco tempo, sobre a posição da mulher no mundo atual. Muito se falou e se fez em prol da emancipação da mulher e muito se fala hoje sobre igualdade de gêneros; as mulheres continuam reivindicando equivalência de direitos. Parece que ainda existe uma disparidade de salários entre homens e mulheres, não só aqui no Canadá, mas no mundo inteiro[1]. Além disso, a “mulher sapiens” – com o perdão da má expressão de nossa presidente brasileira – reclama  maior participação no comando econômico e político.

Devo declarar de antemão, e felizmente, que não sofri esse tipo de discriminação na minha vida de profissional liberal, mas parece que as estatísticas provam que há realmente tratamentos desiguais às mulheres no âmbito do trabalho. Obviamente, temos que lutar para terminar com esse atraso horroroso.

Por outro lado, creio que há exageros numa nova corrente de pensamento que tem tomado força ultimamente. Acho demasiado dizer que os dois sexos são exatamente iguais em tendências e capacidades, e que só ficam diferentes porque recebem educação direcionada para que se tornem assim. Acho redundante dizer isto, porém parece que há quem não perceba: a anatomia e a fisiologia são diferentes e conduzem a desenvolvimentos físico e psicológico característicos de cada sexo, intrinsecamente ligados a instintos básicos, dos quais não escapamos, como animais que somos.

Contudo, para não ferir susceptibilidades, doravante neste texto, não vou mais escrever “homem” e “mulher”. Vou chamar os antigos homens de GPE (que têm genitália predominantemente externa) e as antigas mulheres de GPI (que têm genitália predominantemente interna). Por favor, GPS continua sendo “Global Positioning System”, e não “grupo provido de seios”. Uma pena que a língua portuguesa não possua artigos, substantivos e adjetivos neutros, como no alemão, e vou ter que usar o masculino genérico. Sorry.

Peço desculpas aos GPE, se estiver errada e que, por favor, me corrijam.

Na minha opinião, nem nas experiências amoroso-sexuais, os GPE são iguais aos GPI, como advogam os defensores da igualdade de gêneros. Acho que os GPI, por mais “liberados” que sejam, mental e sexualmente falando, incorrem no erro de acharem que podem abordar intelectualmente o sexo como os GPE. Não podem. O que vou dizer parece óbvio... e é mesmo. Somos feitos anatômica e hormonalmente diferentes. O nosso cérebro tem conexões diferentes. O nosso sexo é diferente. Porque estamos presos, GPI e GPE, a funções e instintos primitivos distintos, dos quais não escapamos, por mais que queiramos achar que o nosso intelecto os tenha sobrepujado. São índoles que existem independentemente de nossa vontade, instintos mesmo.

O sexo do GPE, o sistema designado para a cópula e reprodução, é um aparelho externo, por assim dizer. É tão comum vermos os GPE fazerem brincadeiras sobre pênis e escroto, como se fossem alguma coisa independente, autônoma, que lhes dá prazer, que muitas vezes os surpreende, como um brinquedo... Como se fosse algo que vem de fora. Parece haver uma sintonia entre esta exterioridade anatômica e a maneira como os GPE experimentam a sexualidade, isto é, o sexo está em um compartimento separado, distinto e independente do recôndito da intimidade dos sentimentos. Obviamente, há muitos GPE que, por força da educação que tiveram, conseguem estabelecer conexões entre os compartimentos mais facilmente. 

Nos GPI, o sexo tem uma posição mais interna, é mais interiorizado. A ereção não é visível como a do GPE e os órgãos genitais de cópula e reprodução não são tão aparentes. Também nos GPI parece haver uma sintonia entre a interioridade do aparelho genital e a maneira como experimentam a sexualidade. Esta parece estar mais associada ao interior de seu ser, não havendo uma divisória evidente que separe compartimentos. O compartimento da sexualidade parece se avizinhar ou mesmo se fundir com o compartimento dos sentimentos, no âmago do estado de ser GPI.

Por esta razão, penso que o GPI não é capaz de ir muito longe em um relacionamento do tipo “amizade colorida”, por exemplo. Ele vai, inevitavelmente, sentir os efeitos da fusão dos compartimentos do sexo e do sentimento – e vai interiorizar a experiência que estiver tendo, por mais que tente intelectualizá-la. E com tantos quantos forem os relacionamentos, e mesmo que sejam contemporâneos. Os relacionamentos não vão ficar isentos de sentimento por muito tempo. Aliás, ouso dizer que um GPI sempre imprime sentimento em seus relacionamentos, desde o início, por mais que tente se convencer do contrário. A não ser que se condicione intensamente para experiências em série e sem compromisso, mas aí já é outra história.

Por outro lado, os GPE embarcam muito mais à vontade numa “amizade colorida” que os GPI. Esta é a “praia” deles. E eles não vão se esforçar para explorar o compartimento interior deles mesmos, se não lhes for apresentada esta necessidade. E essa necessidade é do GPI, é ele que tem que levantar a sua bandeira e estabelecer critérios. 

“Mulher é desdobrável”, como diz Adélia Prado; ela vai se desdobrar para se adaptar às situações, mas não sem estar sacrificando alguma parte da sua interioridade. 

Depois de transcrever um verso da grande poetisa, já tenho salvo-conduto para prosseguir com minha linguagem “antiquada”, usando os termos homem e mulher.

Então, eu acho que, muitas vezes, quando as mulheres pensam que estão ficando mais “modernas” e “feministas”, elas estão é perdendo sua identidade, moldando-se à moda dos homens. E vou mais longe. Sem saber ao certo do que se trata, o homem quer que uma mulher lhe mostre o caminho do sentimento. É aí que ele vai se descobrir e se completar. Se não, ele não vai além da “amizade colorida”, e não vai explorar seus próprios compartimentos internos.

Como sou mulher, e antiga, posso estar sendo muito tendenciosa nessa análise. Seria interessante saber o que os homens pensam da minha colocação...

Ah, já ia esquecendo de contar que, enquanto eu devaneava, o GPE daquela senhora chegou e foram embora, felizes para sempre.








sexta-feira, julho 03, 2015

Dia do Canadá... E Luisa, onde está?

Publicado também na KBR Editora Digital:
https://cronicasdakbr.kbrinternational.org/2015/07/04/dia-do-canada-e-luisa-onde-esta/
https://www.cronicasdakbr.com/2015/07/04/dia-do-canada-e-luisa-onde-esta/


"Change is not made without inconvenience, even from worse to better."
   - Richard Hooker

Esta semana, especificamente no dia 1º de julho, uma de minhas sobrinhas mal se formou na universidade e saiu de mudança para fora de Minas Gerais, convidada para trabalhar em outro Estado. Isso é coisa para se festejar, principalmente dadas as dificuldades que os jovens estão enfrentando para arrumar emprego no Brasil, atualmente. Mas ir instalar-se longe da família é sempre algo dolorido, por mais que represente algum tipo de realização pessoal... eu que o diga, quando me mudei para o Canadá.

Interessantes foram as coincidências e fiquei me sentindo em agradável sintonia: minha mudança também ocorreu em um 1º de julho, um dia dos mais movimentados por aqui. Além de ser o "Canada Day", é o dia das mundanças para os locatários canadenses franceses – “le jour du déménagement” na Província do Quebec – um fenômeno único no mundo. Na época eu nem sabia desse detalhe, igualmente ignorado por minha sobrinha Luisa, que-não-é-aquela-que-está-no-Canadá.

A tradição começou como uma medida humanitária do governo colonial francês da “Nova França”, que proibia os latifundiários de despejar seus arrendatários antes de as neves do inverno derreterem. Isso virou lei e se estendeu aos aluguéis urbanos, cujos contratos tinham que terminar em 30 de abril e os novos iniciavam em 1º de maio (alguns lugares dos Estados Unidos também tinham esse costume, mas somente no Quebec ele perdura até hoje). 

Posteriormente, nos anos 1970, passou-se a adotar a data de 1º de julho, para evitar os problemas relacionados com a transferência de crianças de uma escola para outra, somente algumas semanas antes do fim do ano letivo. Além disso, a mudança sendo efetuada em um feriado, os trabalhadores não têm que sacrificar um dia de trabalho.

Dizem as “más línguas” que a data escolhida foi uma decisão deliberada dos partidários da soberania do Quebec, para desencorajar a participação na festa patriótica do Canadá. Estando ocupados com suas mudanças, ficavam isentos de participar das festividades. Mesmo que o motivo não seja este, convenhamos que a confusão instalada com as mudanças coletivas não ajuda em nada a embelezar o dia dedicado a celebrar o orgulho de ser canadense.

Nas grandes cidades do Quebec, a movimentação das pessoas e tranportadores de cargas parece uma loucura generalizada. As ruas são tomadas por caminhões de mudança, por caminhonetes abarrotadas de móveis e eletrodomésticos amontoados e, muitas vezes, mal acondicionados. Até mesmo bicicletas servem de veículos de carga improvisados. Os preços das transportadoras sobem como foguetes! 

Muita tralha é deixada para trás, em becos ou nos passeios; as cidades tomam o aspecto de um grande depósito de quinquilharias. Muitas pessoas se interessam por estes refugos e os levam embora, mas ainda sobra muita coisa espalhada por todo lado. Não sei se são os proprietários dos imóveis que acabam ficando com a tarefa de limpar os passeios ou se é a prefeitura da cidade. 

Para um povo que se gaba tanto de ser organizado, limpo e de primeiro mundo, o caos que se vê, justamente no Dia do Canadá, é algo surpreendente e assustador.

Ainda mais lamentáveis são os casos de muitos animais domésticos que, como os móveis e equipamentos, são também abandonados, e o trabalho da Sociedade Protetora dos Animais aumenta sobremaneira, nessa época. Nem parece o mesmo lugar onde se ouve tanta gente defendendo os direitos dos bichinhos, durante todo o resto do ano. 

Também inimaginável o volume de pedidos para instalações de telefone, internet, TV a cabo etc etc. São incontáveis as solicitações de reparo de estragos deixados nos imóveis pelos inquilinos. A Província do Quebec é a única no Canadá que não exige dos locatários um depósito bancário preventivo para estas eventualidades... E como não podia deixar de ser, os aproveitadores marcam presença.

Não consigo entender a razão desta loucura que leva todos a se mudarem no mesmo dia. A resposta que se obtém unanimemente é que os contratos de aluguel terminam em 30 de junho. Mas por que esta compulsão em fazer os contratos todos com a mesma data de término? É a tradição, dizem...

Será que essa tradição do povo “québécois” reflete um sentimento de insubmissão que remonta à perda do seu território para os ingleses? Seria, talvez, um desejo recalcado de mudança em outra escala, que se manifesta, inconscientemente, nesse ritual coletivo repetitivo, todo ano, exatamente no Dia do Canadá?

De qualquer modo, espero que todas essas pessoas que tiveram que mudar de casa, tenham horizontes promissores pela frente, e que possam realizar aquilo que buscam como objetivo na vida. 

Quanto ao Brasil, desejo com toda a força do meu coração, que cada vez mais jovens desfrutem da chance de estudar e que tenham vontade e determinação, como minha sobrinha, de aplicar o que aprenderam em prol de um mundo melhor; mesmo que, para isso, tenham que sair do conforto de estar perto da família.

Sei que mudanças sempre envolvem muitos inconvenientes, mesmo quando é para melhorar, como diz Richard Hooker, na epígrafe. Se o sacrifício é feito tendo em vista um bem maior, que seja para nós mesmos, de modo que possamos contribuir com algo de bom, claro que vale a pena!