Catedral Nossa Senhora da Boa Viagem (website da Arquidiocese de BH) |
Quando minha mãe ainda
estava em plena atividade física e mental, costumava sempre dar uma passadinha
na Catedral de Nossa Senhora da Boa Viagem. Não era a paróquia dela, mas gostava
de ir lá. Nunca perguntei por que razão, mas posso deduzir: foi onde se casou,
havia horas com o Santíssimo exposto para adoração, era lá que meu pai fazia “adoração
noturna”.
Já mais idosa, não podia ir
sozinha, sobretudo por causa da violência urbana em Belo Horizonte – as vítimas
preferidas dos “pivetes” daquele tempo eram mulheres e idosos. Atualmente,
penso que não há mais escolhidos, todos são presas fáceis para a bandidagem que
anda armada.
Minha mãe tinha uma lista de
almas por quem ela mandava celebrar missas. Desconhecidos também eram agraciados.
Assim, ela era convicta de que beneficiava as “almas do purgatório”. Tinha até
"conta" na secretaria da Paróquia de Boa Viagem, telefonava para lá e enumerava
os pedidos. Como se fazia antigamente nos armazéns, todo mês ela ia pagar sua
dívida. Sempre arranjava um jeito de ir. As moças que trabalhavam lá já eram
conhecidas.
De modo geral, as almas que
contavam com aquela atenção mensal eram de pessoas já falecidas, mas, vez por
outra, uma missa em Ação de Graças por favor Divino alcançado por algum
familiar vivo entrava na lista de encomendas. Foi o que aconteceu comigo, certa
vez.
Já escrevi sobre este
episódio [1], mas tenho tamanha gratidão, que não resisto, conto o caso mais
uma vez, à guisa de louvação. E quem ler este leva o presente de poder ler
outro, não de minha autoria – um texto encantador, de quem verdadeiramente tem
o dom literário, cuja leitura me fez lembrar de minha mãe e de tantas outras
almas, desencadeando uma salva de ave-marias, que a compulsão ainda não me
permitiu terminar de rezar – são muitas 😇😂. O link desemboca no Facebook [2], na página do escritor, arquiteto, fotógrafo, etc, Eduardo Affonso; espero que o leitor
tenha a possibilidade de ver.
Mas, voltando ao meu caso, tinha
eu obtido êxito em algum ponto do percurso normal da minha vida, uma etapa
qualquer vencida, não me lembro mais qual, comum na vida de qualquer pessoa;
mas para minha mãe, cada etapa que seus filhos venciam era motivo de muita
alegria e agradecimento a Deus, como graça concedida. Ela havia, então, mandado
celebrar missa em ação de graças.
Quis que fôssemos com ela,
minha irmã e eu. Pois bem, fomos. Como de costume,
o padre leu as intenções da missa em voz alta. Para nossa surpresa, o meu nome
foi anunciado como de uma pessoa falecida, para cuja alma rogávamos a Deus
perdão e salvação eterna. Ficamos perplexas, por alguns instantes. Em seguida,
nos entreolhamos como se nos perguntássemos se tínhamos entendido a mesma
coisa... Sem dizer nada, continuamos ali, até o final da missa; eu estava em
estado de choque.
Segurei o choro tanto quanto pude, mas não consegui me conter ao chegar
em casa. Minha mãe chorava também e me pedia desculpas. Coitada, ela não tinha
culpa. Havia sido um mal-entendido; eram tantas missas em intenção de tantas
almas na lista dela, que a secretária pensou que fosse mais uma e ali
acrescentou meu nome. E, afinal, o que valia era a verdadeira intenção.
Passou... aquele mal-estar se dissipou rapidamente, quase virou anedota. Eu
estava viva.
Hoje em dia, agradeço infinitamente à minha mãe, pois não sei, após a
minha morte, se haverá alguém de meus conhecimentos que se lembre de mandar
celebrar missa em intenção de minha alma ou que ainda acredite nisso; pelo
andar da carruagem... Por via das dúvidas, já tive uma, minha mãe já garantiu alguns pontinhos para mim. Onde ela estiver, se puder "me ler", saiba que sou muito agradecida e rendo graças a Deus pela mãe que tive... Mais uma ave-maria por ela, que amanhã completa três anos que partiu em "boa viagem"! 🙏
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