https://cronicasdakbr.kbrinternational.org/2015/08/08/lamurias-e-estrelas-cadentes/
http://www.kbrdigital.com.br/blog/lamurias-e-estrelas-cadentes/
e
https://www.cronicasdakbr.com/2015/08/08/lamurias-e-estrelas-cadentes/
“Mais au bout du
ch'min, dis-moi c'qui va rester de not’ p’tit passage dans ce monde effréné. On
s’dira que l’on était, final’ment, des étoiles filantes. [1]”
Jean-François Pauzé
O mês de agosto é um
dos melhores, aqui no hemisfério norte, para ver as chuvas de estrelas
cadentes. É muito bonito. Mas falar de estrelas, pior ainda, ouvir uma certa estrela,
para nós brasileiros, está sendo difícil, nos últimos tempos... Mais ainda
amá-la.
“Uma tristeza que paira...”
Essa observação, em um email que recebi
de minha sobrinha, embora fazendo referência a um outro assunto, definiu tão
bem o que estou sentindo sobre o Brasil, algo que toca meu coração lá no fundo.
É como se eu estivesse vendo através de um binóculo colocado invertido diante
dos olhos, as imagens passando cada vez mais diminutas, longínquas, deixando o
rastro de uma imensa amargura. Estou longe do meu país e ele cada vez mais
longe de mim e dele próprio, como se isso fosse possível – tudo parece ser possível.
Mais ainda esta semana,
após tantas reviravoltas, mais desilusões para quem acreditou em dias melhores,
numa nação mais igualitária, mais justa,
com mais segurança, educação, saúde, tantas promessas de reformas jamais
cumpridas. Estou chorando junto com o meu povo, porque também acreditei, um
dia, naquela estrela de esperança que o Partido dos Trabalhadores desenhou na
sua bandeira. Mas minha ilusão foi rapidamente dissipada, a estrela era falsa
ou, talvez, tenha sido apenas uma estrela cadente, um projeto de alguns
idealistas que foram enganados pelos seus companheiros que tinham interesses
próprios de enriquecimento e poder.
Por favor, deixem-me
chorar, preciso de tempo para fazer esse luto. Estou vendo passar aquelas
imagens no meu binóculo ao contrário; tenho que rever esse filme, preciso
relembrar, expurgar.
Tenho muito o que
lamentar, lembrando da minha infância e juventude sufocadas pelo silêncio
aterrador que reinava no Brasil, sob o signo do medo e da incerteza daqueles
tempos. Na época, eu não podia avaliar o impacto de crescer num país quase
constantemente em estado de sítio, nem sabia ao certo o que se passava. De
repente, essa ou aquela rua era invadida por militares do Exército, armados com
metralhadoras... Cochichávamos entre nós, olhando pelas gretas das janelas: -
“Devem estar procurando algum “subversivo”. Que horror! O que será que vai
acontecer?”
Quero chorar por todos
aqueles que foram torturados e mortos, honrando seus ideais; pelas famílias que
nunca mais viram seus entes queridos desaparecidos. Por certo foi por causa
deles e dos que fizeram a luta armada, que a Ditadura Militar se instalou e se
obstinou, mas nós, o povo, acreditávamos que muitos daqueles que eram chamados
de "subversivos" tinham ideais nobres para o bem da nação e os respeitávamos e
admirávamos pela sua coragem; não só por eles mas também por causa dos que se
radicalizaram, acabamos todos nós sofrendo, uns mais, outros menos.
Foi um tempo de medos,
de ameaças: por um lado, tínhamos pavor de um comunismo como o de Cuba, que
prendia, torturava e fuzilava no “paredón” quem fosse contrário ao regime; e
era essa a ameaça que os guerrilheiros brasileiros representavam. Por outro, tínhamos pavor da ditadura que estávamos vivenciando no nosso país, que
também fazia as pessoas desaparecerem, serem torturadas e mortas. Foi nesse
tempo de extremos que cresci, acuada, como tantos outros brasileiros da minha
geração.
Depois de muitos anos, aos
trancos e barrancos, veio um arremedo de democracia e caímos nas garras do
“Caçador de Marajás”, sendo ele próprio um deles, escolhido pelo povo, na
primeira eleição direta para Presidente da República, após a ditadura.
Conseguiu confiscar o dinheiro do Brasil inteiro, que assistiu ao descalabro
com perplexidade, única reação que sabíamos manifestar, depois de longos anos
de repressão. Mas o “impeachment” veio em oposição à corrupção no governo.
E o Brasil retomou mais
um fôlego, para prosseguir no processo de democratização; houve tempos de
trégua, de desenvolvimento... mais alguns anos e caímos nos calabouços da maior
corrupção da história do país. Quando pensávamos que podíamos recobrar alguma
confiança e quisemos fazer brilhar uma estrela que prometia só bondades ao povo
– “sem medo de ser feliz” –, o que tivemos em troca foi esta decadência moral
que estamos vendo, imposta por este partido político degenerado, em conchavos
medonhos. Usurpando o nome daquelas pessoas que lutaram pela nossa sociedade e
que morreram como mártires, este pseudopartido dos trabalhadores se assentou
no trono da iniquidade e está zombando de nós, pisoteando no povo que lhe deu
sustento.
Se fosse uma crise
financeira em consequência do contexto internacional, tenho certeza de que os
brasileiros aguentariam o tranco, como tantas outras vezes já o fizeram. Mas o
que ninguém suporta mais é a mentira, a corrupção, levando embora o dinheiro
e a esperança colhidos com o suor dos que realmente trabalham.
Não foi só a estrela do
partido que caiu. Todos nós, brasileiros, estamos sendo arrastados por ela,
somos estrelas cadentes.
E essa tristeza que
paira...
Muitos me perguntam,
aqui no Canadá, sobre os horrores de corrupção acontecendo no Brasil, sobre a
degringolada geral. Como isso foi acontecer num país tão promissor? Alguns me
olham com um olhar compadecido e me dizem para que não me preocupe, que estou
fora do país, que isso não pode me afetar.
Vou olhar para o céu e
ouvir as estrelas... “Ora (direis) ouvir
estrelas! Certo perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto, que, para
ouvi-las, muita vez desperto e abro as janelas, pálido de espanto...[2]
Sim, vou refletir, enquanto cai a chuva de estrelas cadentes.
O povo brasileiro é forte!
A prova disso está na sua história, por tudo o que passou e como evoluiu, com
tantas vozes clamando por justiça e honestidade. Não pode ficar preso às
desilusões. O triste presente que está vivendo vai-se transformar, inevitavelmente,
em passado. E terão que construir o futuro, com o que estão aprendendo hoje.
Aprender é preciso!
Aprender é preciso!
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