http://www.kbrdigital.com.br/blog/duas-solitudes/
e
https://www.cronicasdakbr.com/2015/08/22/duas-solitudes/
“Je peux voir
les belles couleurs des solitudes. Elles se donnent la main de longs bras.
” (L’enfant ailé, da
autora)
Está ficando cada vez
mais difícil escrever sobre os problemas do Brasil, parece que estamos chovendo
no molhado, sem produzir frutos. Ninguém mais está aguentando ouvir falar das
falcatruas e dos ódios que se acirram, colocando irmão contra irmão. Os
escândalos se multiplicam, se agravam, nada se resolve a contento. Isso acaba
minando a psique de qualquer um.
Mas não consigo me
anestesiar diante de tanto desvario, fico com a sensação de que não posso me
calar, pois quem cala consente. Não gostaria que o povo brasileiro se
fragmentasse em solitudes, como se diz aqui no Canadá.
A expressão “duas
solitudes” surgiu no romance do escritor Hugh MacLennan, fazendo alusão à falta de comunicação
e de vontade de se comunicar, e ao distanciamento cultural entre os canadenses
de origem inglesa e francesa, em seu livro intitulado “Two Solitudes”,
publicado em 1945.
Mas o Canadá já tinha
mais que duas solitudes, quando o autor usou a expressão, pois os povos
autóctones, que são os índios e os inuits (esquimós), de tão isolados e distanciados,
são esquecidos por muitos que abordam essa problemática. Diga-se de passagem
que, mesmo entre os autóctones inuits e indios, não há entrosamento.
Atualmente, temos uma
solitude a mais, que é a dos imigrantes. No meu caso é diferente, pois eu me
casei com um canadense, passando a ter convívio com as entranhas do país. Mas
as famílias que imigram e que não têm algum elo forte como esse, permanecem
sempre um pouco à parte. Para os que têm costumes e tradições diferentes, por
mais que sejam criadas leis de “acomodações razoáveis”, que aceitam essas
diversidades para que se sintam bem, não se consegue a integração entre os
povos.
Embora não haja
animosidades evidentes, estes desencontros causam uma constante tensão, existe
um descontentamento latente que paira civilizadamente no ar.
Quanto ao Brasil, com
muita tristeza, tenho observado a fragmentação da população. Vários
antagonismos estão surgindo, ou talvez melhor dizer recrudescendo. Alguns estão
seguindo uma certa tendência mundial (branco x negro, homo x heterossexual... e
por aí vai). Mas há um deles que é próprio do Brasil e que podemos resolver
mais rapidamente, se quisermos: é a rivalidade que está dividindo o país, entre
adeptos do PT e do PSDB, partidos até bem semelhantes, mas que se confrontaram
nas últimas eleições presidenciais; a maneira como as campanhas eleitorais
foram conduzidas e o resultado apertado a favor da candidata do PT deixaram uma
sequela em parte da população, que está sendo difícil de superar. Tanto os
políticos de ambos os lados quanto os partidários deles estão perpetuando a
disputa ad æternum, num sintomático jogo entre “nós e eles”, trocando
acusações, sem buscar soluções.
A situação está tão
grotesca que, se alguém apresenta alegações justas contra um político ou
governante, mesmo que o faça sem partidarismos, vem logo um oponente dar
exemplos criticáveis do outro lado, sem sequer considerar o mérito da questão; virou
uma briguinha mesquinha. Numa sociedade madura, os dois grupos da população,
que apoiaram os candidatos, ao descobrirem erros, seja de quem for, deveriam se
unir e tentar ajudar o país a se livrar desses problemas. Falta humildade,
sobra arrogância.
Os ódios estão chegando
a tal ponto, que há cidadãos armando verdadeiras batalhas verbais, às vezes até
chegando às vias de fato, como se cada um estivesse defendendo ardentemente a
própria mãe...
Não nos iludamos,
historicamente sabemos que os nossos governantes e políticos nunca cuidaram do
povo como quem os escolheu para defender seus direitos, missão para a qual
recebem altos salários, pagos por este mesmo povo; nunca foram como mães,
jamais trataram o povo brasileiro nem como irmãos. Muito menos agora, que
estamos presenciando roubos de tal monta que jamais poderíamos imaginar. E é justamente
o povo que está sendo assaltado.
Creio que esta
belicosidade que se instalou na população se deve à desorientação do governo e
à grave situação de crise que impera, causando mal-estar geral e desequilíbrio
emocional em muitos. Mas minha preocupação é para que não se solidifiquem “duas
solitudes” – “nós e eles” –, cada qual interessada em defender o seu lado,
esquecendo de que seus políticos não estão cuidando das questões graves que
existem e que merecem ação imediata.
Seja qual for a causa
que tenha desencadeado esse caos em que o Brasil está atolado, é preciso pensar
em sanar os problemas o mais rápido possível, deixando as picuinhas de lado.
Essas rivalidades e desentendimentos não levam a nada, só aumentam o nível de
stress que já está elevadíssimo, só pioram a situação.
Não devemos imitar os
políticos e governantes que se engalfinham, cada um querendo levar mais
vantagem que o outro. A repetição dessa atitude no seio da população só traz
inconvenientes. Em estado de irritabilidade e raiva, não conseguimos raciocinar
direito. Temos que juntar nossas cabeças e colocá-las para pensar e analisar
melhor o que está acontecendo no país, isentos de partidarismos; só assim
poderemos ajudar a encontrar soluções inteligentes para os males que nos
afligem, sejam eles quais forem, venham de onde vierem. Disso depende nossa
vida futura no Brasil.
Esses ataques mútuos entre
cidadãos só enfraquecem o poder de decisão da sociedade. A politicagem,
pejorativamente falando mesmo, a bandidagem, a roubalheira, que estão grassando
no nosso país, são muito graves. Não podemos tornar vãos nossos esforços, não
podemos desperdiçar nossas energias nos digladiando entre nós mesmos, enquanto
a bandalheira continua. Temos que agir contra os prejuízos que nos foram
causados e precisamos correr contra o tempo. Se o povo não se unir, certamente
sairá perdendo mais uma vez.
Não deixemos imperar o
signo do “nós e eles” que querem impingir no âmago da população. Isto, sim, é
golpe. Porque somos todos da mesma salada. Se existe um “nós e eles”, eles são
os políticos e governantes nos sugando, nós, o povo brasileiro.
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