terça-feira, outubro 10, 2017

Estado de avareza

Photo Credit: esportefera.com.br


            O Brasil não é para principiantes” Tom Jobim
Que o país está doente, não resta a menor dúvida, mas é extremamente difícil chegar-se a um diagnóstico do Brasil. A História, contudo, nos dá indícios que podem explicar alguns dos sintomas e suas causas. A doença cujos sintomas mais se assemelham ao Estado/estado brasileiro é a avareza. Políticos, empresários e governantes, que já são ricos, que já vivem como nababos, continuam acumulando riquezas produzidas pelo povo, sem dar-lhe retorno.
Comparações entre o Capitalismo e a avareza já foram feitas por muitos autores. Mas esta explicação não é compatível com a história mais recente do Brasil, aproximadamente nos últimos 20 anos, quando o país esteve sob lideranças socialistas. Havia a esperança de que tomasse novos rumos, com diminuição das desigualdades. No entanto, vimos se multiplicarem, como nunca, quadros brutescos de avareza entre os poderosos.
O avarento tem obsessão por acumular dinheiro e não gastá-lo. Que razões levam uma pessoa a ter essa atitude de ganhar dinheiro para guardar? Qual é o perfil psicológico de um avaro? Segundo os entendidos, trata-se de uma pessoa que tem medo da incerteza do futuro, ela é insegura quanto ao que pode vir a acontecer. Pode ocorrer algum imprevisto, alguma desgraça. O avaro é pessimista, e o dinheiro é sinônimo de segurança. A sua constante preocupação com o futuro o leva a evitar gastar dinheiro.
Como em todos os males, há graus de intensidade. Em casos extremos, a pessoa com esse distúrbio pode ter pavor de ficar pobre no futuro. Cria-se um vício, ela precisa acumular riquezas sempre mais e mais. O dinheiro passa a ser o seu objetivo de vida, e o fato de tê-lo passa a ser fonte de supremo prazer, torna-se mais importante que todos os outros elementos do seu cotidiano, transforma-se no motor de sua autoestima e, até mesmo, motivo para se superestimar.
A figura do avaro aparece com certa frequência em histórias de ficção, muito bem representada por personagens tragicômicos. A arte é incomparável em sua capacidade de reproduzir os diversos ângulos das feições humanas. O exemplo clássico é o do Sr. Scrooge, de Charles Dickens.
Vários textos literários descrevem, com maestria, esse desvio de caráter, entre eles o romance Un homme et son péché, do canadense Claude-Henri Grignon. É típica a arrogância e ânsia de poder do seu personagem avaro, que esconde, trancado em  subterrâneos recintos, o seu ouro precioso, conquistado às custas da exploração do alheio, incluindo a exploração dos pobres. Na calada da noite, consciente de sua transgressão viciosa, mas sem conseguir se desvencilhar do prazer que lhe propicia, ele visita seu tesouro, solitariamente, para abraçá-lo e beijá-lo.
Esta imagem grotesca me veio à mente ao ver casos de brasileiros famosos que, aproveitando de sua situação de poder, se apoderaram do erário público, sob a forma de dinheiro em espécie, obras de arte e até mesmo barras de ouro escondidas em cofres de segurança máxima, tudo finalmente desmascarado e estampado nas primeiras páginas dos jornais, revelando esse perfil que parece caricatural, mas que é tão real.
Em alguns casos, parece haver situações em que governantes usaram a fraqueza moral dos avarentos para pôr seus planos de poder em prática. Mesmo nos governos em que houve maior generosidade para com os pobres, com a efetivação de programas sociais, e até partilha com países irmãos, a avareza prevaleceu, pois o aparente “desapego” foi compensado por somas exorbitantes em proveito desses próprios governos, seus políticos e empresários “amigos”, desencadeando uma crise sem precedentes, que anulou o efeito da generosidade, deixando o brasileiro pobre mais pobre ainda.
O que acontece no Brasil foge a qualquer tipo de classificação ideológica, nenhuma teoria se encaixa com o que é praticado no país. Só nos resta combater essa mórbida epidemia que nos assola, impedir que haja recidivas com os mesmos infames agentes viciados – estes precisam ser peremptoriamente impedidos de retornar ao cenário nacional, onde haja a mínima chance de acesso ao poder. Temos que investir em uma convalescença rigorosamente controlada da nação e é preciso agir rápido.

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