sexta-feira, janeiro 19, 2018

Coentro não dá rima pra mim, tô fora

Coriandrum sativum

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- Você não gosta de coentro? Eu não. Tenho uma intolerância visceral a esta folhinha que parece inocente e tão apreciada por tanta gente. Recentemente, fiquei sabendo que esta planta dá muito o que falar e que já foi até mesmo assunto para pesquisa genética, tão acaloradamente divide opiniões gustativas (links ao final do texto).
Segundo os pesquisadores, há dois fatores principais que podem estar relacionados ao fato de gostar ou não de coentro, embora não se tenha chegado a um veredicto definitivo. Um deles seria o hábito de usá-lo em pratos tradicionais de certas regiões do planeta favorecendo seus habitantes a se acostumarem e gostarem dele. Mas mesmo nesses lugares, há pessoas que têm verdadeira aversão ao ingrediente, o que levou alguns pesquisadores a pensarem em uma causa genética como segundo fator.
Há tantos alimentos, tantos temperos que uns gostam e outros não, e ninguém se preocupa. Penso que, no caso do coentro, o que intrigou os cientistas foi a intensidade da aversão de quem não gosta, como eu. Por que essa repugnância tão forte?
No início dos anos 2000, usando o olfato e o paladar como parâmetros, o pesquisador em neurociência Charles Wysocki, do Monell Chemical Senses Center, na Filadélfia, Pensilvânia, testou centenas de gêmeos uni e bivitelinos, presentes em um festival de gêmeos em Ohio, e encontrou em cerca de 80% dos gêmeos idênticos a mesma reação à planta, contra cerca de 41% dos não idênticos, o que sugere um substrato genético para esta característica.
Na tentativa de identificar uma base genética sólida, dois outros estudos foram realizados, um por Lilli Mauer, da Universidade de Toronto no Canadá, em 2011, e outro pela equipe de Nicholas Eriksson da companhia 23andMe, na Califórnia, em 2012. Em ambos os estudos foram encontradas variantes em genes de receptores olfatórios e, na pesquisa do Canadá, também em genes de receptores de gosto amargo, relacionado às reações ao coentro.
Seria interessante que os cientistas estudassem mais sobre isso. Há um consenso de que a aversão seja causada pelo cheiro da planta. Apesar de eu mesma sentir uma aversão intensa ao cheiro dela, penso que há algo mais amplo do que isso. Creio que o aroma é o componente mais evidente, mas não é o único motivador dessa rejeição visceral. Pelo menos no meu caso, a magnitude da reação é muito maior, embora o odor que a planta exala tenha também um papel importante na aversão que me provoca.
Na casa dos meus pais, nunca tivemos queda por especiarias ou receitas culinárias elaboradas e bem condimentadas. Usávamos o essencial, ou seja, sal, alho e cebola, óleo de cozinha, às vezes uma salsinha, se tanto. E era muito bom! Quando muito, uma Pimenta Malagueta, que minha mãe adorava.
Abro parênteses: cá estou eu usando a primeira pessoa do plural, até parece que eu sou afeita à cozinha. Sou um fracasso. Fecho parênteses.
Por um determinado período, tivemos uma cozinheira mais despachada, que resolveu ela própria ir comprar os ingredientes para cozinhar. Com certeza, já estava cansada da monotonia gustativa lá de casa. Um belo dia, na primeira garfada, senti que tinha engolido algo estranho, mas não consegui definir muito bem se era o gosto ou o cheiro que tinha me desagradado. E a tal ponto me desagradou que tive que ir correndo ao banheiro para vomitar, coisa que tenho uma certa dificuldade para fazer, em outras situações nauseosas que se apresentam. Já comi alimentos de que não gostava, por educação, sem maiores problemas, mas desta vez, foi como se meu estômago estivesse dizendo, peremptoriamente: - Isto não!
Não consegui engolir mais nada que estava naquele prato pois percebi que havia um cheiro muito incômodo. Mais estranho ainda foi que ninguém na mesa sentia o tal cheiro no meu prato, só eu. Fui perguntar à cozinheira se havia alguma coisa diferente do habitual na comida e ela foi logo respondendo: - Ah, hoje comprei coentro e resolvi usar para temperar. Em seguida, ela pegou umas folhinhas que restavam e me deu para cheirar. Era exatamente aquele cheiro e eu tive que voltar correndo para o banheiro. Nem preciso dizer que nunca mais passei perto de coentro. E, ainda por cima, o episódio me rememorou uma outra vez em que passei mal após um jantar com frutos do mar... Aposto que devia ter coentro.
Com o resultado dessas pesquisas científicas, então, está explicado, tenho esse tal traço genético. Fiquei aliviada, não é fricote.   
       Passaram-se anos... de outra feita, confirmei a minha intolerância quando passei um creme de mão e minhas mãos foram ficando vermelhas e coçando... Nem estava me lembrando do coentro e nem sabia que podia entrar em composição de creme de mão. Devido à reação (tipo alérgica mesmo), tive curiosidade de ler os ingredientes: o danadinho do coentro estava lá.
Penso que essa aversão é a manifestação de alguma coisa mais complexa. Esperemos que venham mais estudos sobre isso.
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P.S.: os estudos genéticos realizados, que constataram a sensibilidade maior a aldeídos, me fizeram lembrar de um teste que era feito em aula prática de laboratório, quando estudei medicina. O professor nos fez cheirar uma substância que, se me lembro bem, continha aldeído, para nos mostrar que alguns sentiam o cheiro e outros não.
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Imagem por Franz Eugen Köhler, Köhler's Medizinal-Pflanzen - List of Koehler Images, Domínio público, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=255535
 Referências sobre os estudos:

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