© Maria do Carmo Vieira-Montfils |
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Sou montanhesa, com certeza. Meus primeiros passos, segundos e terceiros, foram sobre o solo de uma cidade com altitudes variando entre 800 e 1100 m acima do nível do mar, de onde brotam cadeias de morros e colinas de mais uns tantos, até 500 m ou menos, somando aproximadamente 1500 m acima do nível do mar, nos pontos mais altos. É um sobe e desce sem fim de ladeiras e sempre tem uma muralha enfeitando o horizonte... tão belo!
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Sou montanhesa, com certeza. Meus primeiros passos, segundos e terceiros, foram sobre o solo de uma cidade com altitudes variando entre 800 e 1100 m acima do nível do mar, de onde brotam cadeias de morros e colinas de mais uns tantos, até 500 m ou menos, somando aproximadamente 1500 m acima do nível do mar, nos pontos mais altos. É um sobe e desce sem fim de ladeiras e sempre tem uma muralha enfeitando o horizonte... tão belo!
Mas a gente sabe que é montanhês
por muitos motivos, não precisa contar os metros; entre tantos, o ar que
respiramos. Ele é mais leve, pede uma respiração profunda, de vez em quando,
expandindo os pulmões com um arzinho fresco, querendo voar. É fisioterapia
respiratória compulsória. O suspiro é de natureza... natural, quando vem alguma
tristeza, a gente já sabe suspirar, é normal.
Percebi mais ainda essa diferença depois
que me mudei. Há muitos anos estou vivendo quase ao nível do mar, embora
longe dele, entre 50 e 100 metros de altitude, num lugar bem plano, visão
desimpedida, onde o lindo e espantoso bailado das nuvens fica exposto, literalmente ao ar livre – mas isso é uma outra história. O fato é que notei que não
suspiro mais como antes. A atmosfera aqui é nitidamente
mais densa, dá a impressão de que posso pegar um pedaço de ar com as mãos – “de
l’air à couper au couteau”. Tem oxigênio em demasia, não estava acostumada com
tamanha regalia.
As montanhas desenham e delimitam o nosso mundinho. Quando era bem pequena, pensava que o mundo acabava na montanha. Li o texto
de uma escritora, também mineira, que disse a mesma coisa – vi que não estava
sozinha nesse pensamento, resolvi partilhar 😊. Aliás, recomendo ler o texto de Elisa Santana, em Luzias (clique aqui), lúcido, poético, dolorido pelos efeitos
da mineração em Minas Gerais.
Essa lembrança de que eu
imaginava o mundo acabando na montanha ao lado é bastante remota, não sei que
idade eu tinha. Não imaginava o que pudesse ter atrás; quando os irmãos mais
velhos subiam o morro perto de casa, eu ficava temerosa por eles, sem saber bem
por quê. Talvez, como meus pais não me deixavam ir, por ser muito pequena, eu
devia deduzir que havia algum perigo. Nossa casa ficava muito perto do Morro do
Pau Comeu – o nome não ajuda –, e eu achava que nós estávamos perto do fim do
mundo. Uma hipótese que passou pela minha cabeça, hoje, é que talvez eu tenha
ouvido alguém dizer que morávamos no "fim do mundo", com sentido de
lugar ruim, e tenha compreendido ao pé da letra, não sei... 😂 – realmente havia,
na família, quem fosse de opinião que nossa casa era mal localizada.
Um dia, ouvi meu pai falando
que, se se fizesse um túnel na montanha, sairíamos em Nova Lima. Imagino que
ele fazia referência a outro local em Belo Horizonte, mas pensei que ele falava
do nosso morro. Aquilo foi como um descortinar para mim – o mundo continuava do
outro lado! Mas me contive, não falei nada com ninguém, com vergonha do que eu havia
pensado antes, que me pareceu, então, um pueril absurdo. Hoje, lendo o
texto da escritora luziense, é que fui lembrar-me desse “fim de mundo”, nosso vizinho,
e dessa luz ao final do túnel – Nova Lima.
Link relacionado:
Barragens de rejeitos
O que não podia imaginar é que aquelas montanhas, tão intrínsecas ao meu
ser, fazendo parte de minha alma, como bem disse a escritora que mencionei,
seriam destruídas um dia e transformadas em lama tóxica
e mortal para nós. Espero que tenhamos
uma luz ao final do túnel, para acabar com essas barragens de rejeito assassinas, para que
nossas amadas montanhas não representem o fim do mundo para os mineiros.
~~~~Link relacionado:
Barragens de rejeitos
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