terça-feira, junho 20, 2017

Sapatos ululantes




Hoje o dia foi lindo, com nuvens cor de chumbo, trespassadas por fulgurantes raios de sol que descortinavam um puro azul ao fundo e faziam a chuva intermitente brilhar fininha – “chuva com sol, casamento de espanhol” – as poças d’água refletindo o espetáculo.
Bons tempos eram aqueles em que se usavam galochas. Lembro-me só das masculinas. Não sei se as mulheres, por vaidade, preferiam ficar com os pés molhados, ou se foi porque passávamos por uma fase de transição, quando nem todos usavam mais. Pesquisando na internet, constatei que agora existem modelos elegantes e coloridos, que se adaptam a qualquer tipo de sapato. Será que alguém ainda usa? Ou têm receio de serem chamados de “chatos de galocha”?
Lembro-me que, em dias chuvosos, ao nos defrontarmos com poças d’água, não estando equipados de galocha, o jeito era saltá-las. Se mergulhássemos os pés, pronto, saíamos escorregando dentro dos sapatos, que faziam aquele barulho encharcado de dar arrepios e nunca eram mais os mesmos depois da aventura aquática.
No Canadá, os sapatos do dia-a-dia podem não ser tão elegantes como os brasileiros, mas são impermeáveis. Aprendi isso logo nos meus primeiros tempos aqui quando, após uma chuvarada, comecei a pular na rua, no trajeto até chegar ao carro. Meu marido parou e, com um olhar entre espantado e irônico, me perguntou o que eu estava fazendo. – Saltando as poças, ora! – fui logo respondendo, com aquele ar de quem estava lidando com uma obviedade... Foi uma lição a mais, para mim, de que mesmo o óbvio é relativo e nem sempre ululante.

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