segunda-feira, junho 13, 2016

Viva a Lusofonia!


Este texto não tem nenhuma intenção de orientar “autoajuda”, o objetivo é rir mesmo. Mas se servir para auxiliar algum semelhante, melhor ainda. Sempre existem semelhantes, inútil nos vangloriarmos da originalidade de nossas trapalhadas. Quando resolvemos partilhar nossas esquisitices, aparece um sem número de casos similares e todo mundo ri ao mesmo tempo.
Rir de nós mesmos é muito melhor do que rir dos outros. Além de ser realmente muito engraçado, é um jeito de resgatar o controle da situação, quando, por exemplo, cometemos uma gafe. Além do mais, isso nos liberta de qualquer barganha que queiramos fazer com o nosso próprio ego; desnecessário ficar arranjando desculpas esfarrapadas, nada de “feitiço do tempo”, tampouco precisamos ter medo ou vergonha de que riam de nós.
Se a mancada que cometemos é daquelas de provocar risadas, nada melhor do que assumir e liberar a gargalhada geral. Rir primeiro é muito melhor do que rir por último. Ninguém fica magoado quando o sujeito e o objeto do motejo somos nós mesmos. Chega a ser um ato de amor ao próximo, pois, assim, ninguém se sente maldoso por estar rindo do outro. Vamos rir juntos.
Para tímidos, é um remédio sem igual. Digo isso por experiência própria. E não me faltam gafes, posso desopilar o meu fígado e o de quem mais quiser saber dos meus casos anedóticos. De relance, já me lembrei de vários. Aliás, deve ser pelo número elevado de ocorrências, que consegui este grau de aperfeiçoamento no processo de zombar de mim mesma. Rir é preciso.
Tenho muitas histórias cômicas relacionadas com minha completa falta de orientação, por exemplo. Definitivamente, não tenho vocação para pombo-correio. Dirigindo carro num itinerário conhecido, se houver alguma coisa que impeça a passagem por uma rua e tiver que tomar um desvio do caminho costumeiro, me perco e tenho que perguntar a transeuntes para que lado devo ir. Agora, tenho um GPS e isso facilitou muito a minha vida. Só lamento não poder usá-lo a pé, quebraria bem o galho dentro de shoppings ou, no tempo em que eu ainda morava no Brasil, na saída do consultório do meu dentista, para achar o elevador. Assim, eu o teria poupado do trabalho de sempre vir à porta, com um sorriso curioso (será que ela vai errar o caminho de novo?) e preocupado em me mostrar a direção.
Fico encantada com uns novos “gadgets” que estão aparecendo no mundo da informática, que mostram tudo, até mesmo onde achar produtos nas prateleiras de um estabelecimento; mas a rima com meu “budget” é apenas um engodo, não dá nem para fazer trocadilho. De qualquer maneira, eu encontraria um jeito de dar mancadas com qualquer dispositivo à minha disposição.
São tantos tipos de gafes, não tenho preferências. Já tentei abrir porta de carro que não era meu, nem era da mesma marca, só a cor parecida. Sem falar de uma vez em que me aboletei no lado do passageiro de uma caminhonete que não era a do meu marido. E ele, rindo do que eu estava fazendo, me perguntou se eu não queria ir com ele. Ainda bem que o proprietário do veículo era seu amigo e, melhor ainda, não estava no carro naquela hora.
Antigamente, gostava de ir trabalhar a pé. Sempre gostei de caminhar. Mas nem sempre tinha tempo, ia de carro mesmo. Um dia, me sobressaltei ao chegar em casa e não ver o veículo na garagem. Roubaram meu carro – fui logo pensando. Mas, não, tinha ido trabalhar de carro aquele dia. Tive que voltar para resgatá-lo, ele estava no mesmo lugar onde eu o havia deixado.
Vivendo no Canadá francófono, tenho uma lista já bem crescidinha de gafes em francês, mas estas vou deixar para uma outra vez. Não, não estou com vergonha de contar. É que o texto ficaria longo demais e tenho uma boa, em português mesmo.
Se todos à minha volta estiverem falando só uma língua, sem problema, eu me comporto bem. Mas quando pessoas que falam línguas diferentes conversam comigo, ao mesmo tempo, cada uma na sua língua, eu sempre misturo tudo. Não serviria para fazer tradução simultânea, pois enlouqueceria os ouvintes, sem me dar conta disso. Quase invariavelmente, falo francês com quem teria que falar português, por exemplo, e vice-versa. Se tiver um terceiro que fale inglês, as frases saem trilingues, sem escapatória.
Certa vez, recebi a visita de uma de minhas sobrinhas brasileiras, fiquei radiante e acelerada, para não dizer eufórica, de estar com ela; pude ressuscitar minha lusofonia já confinada ao limbo há tanto tempo, pois nem estava pensando em português mais, tal a imersão no francês. Com a chegada dela, aproveitei para “tirar a barriga da miséria”, embora ela seja poliglota e eu pudesse continuar falando a língua local, sem nenhum problema.
Passeando pela cidade de Saint-Hyacinthe com ela, eu na direção do carro, a uma certa altura, havia uma rua interditada e um inspetor redirecionando os veículos. Pronto, a coisa já me perturbou. Justamente aquela única rua por onde eu passo para ir ao centro da cidade. E eu ainda não tinha o meu GPS. Parei perto do inspetor e perguntei a ele por onde poderia passar, dando-lhe os detalhes da destinação desejada. Ele me respondeu, tranquilamente, e lá fomos nós.
- O que houve? Pourquoi tu ris? – perguntei à minha sobrinha.
- Tia, você falou em português com ele, ele respondeu em francês, como quem tivesse compreendido. Isso está muito engraçado, tia.
Mais tarde, comentando o episódio com minha cunhada canadense, que mora em Saint-Hyacinthe, ela me pediu para descrever como era o inspetor. Embora ele não tivesse nenhuma característica muito diferente que o distinguisse, a minha descrição foi suficiente para que ela concluísse que se tratava do único funcionário português que havia na cidade. Era ele, pois. Isso, sim, é que é sorte!
Viva a lusofonia!

Um comentário:

  1. Se o texto tivesse 100 páginas, ou seja, fosse um livro, eu o leria sem intervalo. A D O R E I !!! Li e enxerguei cada evento. Você é muito boa nisso! 👏👏👏😍😙

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