segunda-feira, julho 17, 2017

Maneira de falar



Não nego que haja muitos mineiros que falam errado, uns por ignorância, outros por gosto, mesmo conhecendo a língua portuguesa, demonstrando carinho para com a gente do sertão, da roça; é um jeito de falar que representa um modo de viver, perto da terra que nos alimenta e que nos dá vida. 
Mas ainda não cedi direitos a essa versão de que não pronunciamos o “nho” dos diminutivos, como em “mineirim”, embora ache até "bunitim". Pronunciamos, sim, o final átono das palavras, só que é uma pronúncia "para dentro", que os outros nem sempre escutam. A articulação se faz dentro da boca, com um mínimo acompanhamento dos lábios; tem um som bem mais baixo que o resto da palavra.
Por exemplo, se um mineiro falar "cafezinho" e "cafezim" (naturalmente, sem forçar nada), eu saberei quando ele falou com o final da palavra e sem o final da palavra. Os outros, que dizem que falamos "cafezim" em vez de "cafezinho", vão dizer que ele falou "cafezim" duas vezes.
Não sei se me fiz compreender.
Outro exemplo, agora com o meu marido, que é canadense. Quando ele ainda não sabia nem português, nem “mineirês”, e eu fui apresentá-lo ao meu irmão caçula, eu lhe disse o seu nome: Mário. Ele me perguntou: ele se chama Mári? Ele não ouviu o "o" final. Atualmente, ele compreende muito bem o mineirês e "ouve" perfeitamente os nossos sons ao final das palavras.
Já para a percepção de um mineiro, há pronúncias de outros estados brasileiros que carregam demais na sílaba final. Quando fiz um estágio na cidade de São Paulo, tinha a impressão de que eles falavam o meu nome quase como os francófonos (não pelo R do francês), eles pronunciam "Carmo" quase como uma palavra oxítona: Maria do Carmooo... um "o" longo.
Interessante, não? Tomamos por base os nossos parâmetros para "definir" os outros. Como em tudo, afinal.
Já que falei dos francófonos, para exemplificar também como tudo é bem relativo e depende da percepção de cada um... Uma colega de trabalho aqui do Québec, certa vez, comentou comigo que é falsa a impressão de que os francófonos falam forçando na última sílaba, eles falam a maioria das palavras linearmente, sem dar força maior a nenhuma sílaba.
Ao dizer que sua pronúncia é linear e não com mais força na última sílaba, isso pode valer para o francês. Para o português não vale, pois quando uma palavra é paroxítona, por exemplo, a tônica é na penúltima sílaba, a pronúncia não pode ser linear. Ao pronunciar a palavra linearmente, o falante está incorrendo no erro de tirar força da penúltima sílaba e colocar na última.
Estas coisas de percepção dos modos de falar são muito interessantes mesmo! Nós tentamos imitar a pronúncia de outra língua, de acordo com o que ouvimos e com as habilidades que temos no nosso aparelho fonador. Morando no Canadá, principalmente no Québec, pude notar isso, mesmo com relação ao inglês. Sem brincadeira, os francófonos ouvem o inglês de um modo bem diferente do que alguém de língua portuguesa. Tenho a tendência a achar que, dentre os que estudaram a língua (mas não viveram em países ou províncias onde se fala inglês), nós pronunciamos melhor o inglês. E eles devem achar a mesma coisa – que eles pronunciam melhor. E sei que acham pois me corrigem. Já cheguei a falar com alguém, uma vez, rindo de mim mesma, que me deixasse falar o inglês com meu sotaque de brasileira. Seria demais querer que, além do meu sotaque brasileiro no inglês, fosse eu obrigada a acrescentar o sotaque quebequense.
Um exemplo: o u de up, para eles é "ó", para mim tende mais para o "a", embora não seja um "a" do nosso jeito. E por aí vai... tenho inúmeros exemplos de outros fonemas que escutamos diferentemente, quando um anglófono fala.
É fácil constatar que cada povo tem o seu sotaque característico, ou por não estar bem treinado para articular os sons que diferem dos que existem na sua língua ou porque escuta diferente mesmo. Raros são os casos de estrangeiros sem sotaque... sei que não é o meu caso, pois já trabalhei com o público e, quando começava a falar, muitos me perguntavam de onde vinha, por terem observado o meu sotaque de estrangeira.
 Enfim, penso que é importante que sempre nos esforcemos para falar o mais corretamente possível, para sermos compreendidos. No mais, "deixa que digam, que pensem, que falem, deixa isso pra lá".

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