sábado, março 25, 2017

O médico – excertos



Trechos de: Nos bastidores do Câncer. VIEIRA-MONTFILS, M.C. Petrópolis, Brasil: KBR, 2015

(Nota : o masculino genérico é usado sem discriminação e unicamente com o intuito de tornar o texto mais ágil)
"O médico - quem é ele? Quem é essa pessoa que quer se arvorar em alguém que cura? O dicionário nos diz que é uma pessoa que exerce ou pode exercer legalmente a Medicina. Desde o início dos tempos, todas as comunidades humanas – até mesmo as mais primitivas sempre tinham alguém que tratava os doentes, por vezes, considerado como uma espécie de mago ou feiticeiro com poderes sobrenaturais. Os conceitos mudaram,  mas ainda existe hoje um remanescente dessa crença, porque consideramos que o médico deve ter uma "vocação" e um talento especial para a prática de sua profissão. Pelo menos, ele deve ser um estudante aplicado, uma vez que na maioria dos países o acesso à Faculdade de Medicina é para aqueles com melhores notas ou os que têm sucesso nos exames para entrar na Universidade. E é compreensível que seja assim, porque o médico é quem vai cuidar do bem mais importante para nos manter vivos a saúde."
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"Tomamos por certo que a busca pela cura é uma idéia lógica. Mas se fizermos uma pausa para pensar um pouco, se tentarmos libertar nossa mente de seu estado de condicionamento habitual, vamos nos encontrar diante de uma atitude que representa uma tentativa de contrariar a natureza perecível do nosso universo o que conhecemos do universo. Na verdade, o médico é uma pessoa que trabalha sempre contra a corrente seu objetivo é reverter os processos naturais que nos fazem perecer. Neste sentido, o médico continua a ser alguém que tem uma vocação para o sobrenatural, não muito longe do feiticeiro das tribos primitivas. Digo sobrenatural , obviamente, em seu sentido estrito, isto é, além das leis da natureza (deste universo como o conhecemos). Claro que, para tratar as pessoas doentes, o médico tem apenas as ferramentas criadas neste mesmo universo e sujeitas às mesmas leis. Mas isso não muda o fato de que é uma ação para combater nossa natureza perecível. Parece paradoxal e eu digo "parece" porque sabemos tão pouco sobre nós mesmos, seria arrogante ter certezas."
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"Por que escolhemos a profissão médica? Que motiva um jovem estudante para decidir por esta área? Posso responder a esta pergunta, em parte, no meu caso. Quando escolhi ser médica, eu queria conhecer mais profundamente o ser humano e tentar ajudar as pessoas. Meu pai era médico e não posso dizer que na minha escolha não fui influenciada por ele, um médico altamente qualificado e dedicado, que praticava sua profissão caridosamente, era considerado uma pessoa abençoada. Em um país onde havia (e ainda ) uma grande parcela da população vivendo em situação de pobreza e numa época em que o sistema de saúde não era tão burocratizado como hoje, ele dedicou sua vida a ajudar os outros. Foi também professor universitário. Com certeza, pessoas assim influenciam fortemente aqueles que estão ao seu redor."
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"Não é fácil ser médico! E é só quando saímos completamente do "cenário", que nos damos conta disso. Os médicos estão tão ocupados em estudar, avaliar e tratar seus pacientes, que não podem se dar ao luxo de se comoverem. Com efeito, muitas vezes, são acusados  ​​de indiferença, porque são muito concisos durante a consulta e o acompanhamento do paciente e aparentam uma certa insensibilidade. Isso é normal e involuntário, como defesa, para manter a sua integridade emocional. E isso é bom, eu acho. Tendo que tratar muitos pacientes, ele deve manter a sua razão, seu intelecto, na melhor condição possível para tomar decisões importantes para o paciente."
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"Com todos os desafios e todas as qualidades necessárias para ser um bom médico, podemos compreender que o orgulho e a vaidade venham-se juntar à lista. E isso é normal, até mesmo útil para o bom desempenho de um papel tão exigente. Compreende-se também que, por vezes, a vaidade pode transbordar. É preciso estar sempre vigilante para não se deixar dominar pelo sentimento de onipotência, porque estamos muito longe desta condição. Na realidade, a onipotência não existe neste mundo perecível. Seria ridículo demais agir como se a tivéssemos.
Às vezes, é o paciente que demonstra uma reverência exagerada para com o seu médico, em um verdadeiro jogo de dominação/submissão. No passado, isto ocorria mais frequentemente. Hoje, a relação médico/paciente mudou graças à facilidade de acesso à informação, para o próprio paciente. Este é cada vez mais presente nas tomadas de decisão. Mas não devemos exagerar, o paciente não tem o treinamento necessário para decidir tudo sobre o seu tratamento. Mesmo quando o doente é um médico, ele nem sempre se encontra em estado emocional suficientemente estável para ser capaz de decidir sobre a própria doença."
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"Por vezes, sinto-me culpada por ter deixado o meu povo, meus pobres, mas essa sensação desaparece quando penso que consagrei a eles grande parte da minha vida, o melhor da minha juventude."

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"- É preciso sempre ter uma atitude de investigação aguçada em todos os sentidos, sempre nos perguntarmos se tomamos o caminho certo."
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"- Planejem seu trabalho e seu descanso. E se se sentirem cansados, desanimados, arranjem tempo para recarregar as baterias. Mas não deixem seus colegas sozinhos na batalha, e, principalmente, não deixem seus pacientes sem consolo. Não desistam, por favor."
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 (VIEIRA-MONTFILS, M.C. Nos bastidores do Câncer. Petrópolis, Brasil: KBR, 2015: http://www.amazon.com.br/dp/B00W46DHBM)

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