Version en français
Abril de 1997, férias, minha primeira
visita ao Canadá, para conhecer meu namorado virtual... Numa bela tarde de
primavera, fui surpreendida, sozinha em casa, com uma nevasca – muito vento lá
fora, tudo ficou branco, nada se via um palmo além da porta de vidro, sequer um
esboço de paisagem. O frio foi aumentando e eu sem saber ao certo como manobrar
as técnicas de aquecimento. O jeito era usar o método que eu conhecia melhor,
agasalhar-me. Apanhei tudo o que encontrei disponível que pudesse servir como
agasalho e me encolhi no sofá, enterrada em meias, paletós e cobertores. Mas
não fiquei sozinha por muito tempo. Logo, logo, comecei a escutar um chorinho
de cachorro do lado de fora. Pulei do sofá e fui para a porta, tentar ver
alguma coisa através do vidro. Não via nada. E sem abrir a porta, claro, voltei
para o meu sofá, ainda mais angustiada, diante de mais aquele imprevisto. O
medo que tenho de cães não me permitiu tomar nenhuma providência e me deixou
mais triste, pensando no bichinho morrendo de frio. Será que morreu? – pensei,
quando não ouvi mais o choro. Talvez ele tenha ido buscar abrigo em alguma
outra casa – tentei me tranquilizar.
No final da tarde, chegou o meu
namorado, que a esta altura já era bem real, não precisávamos mais da internet
para nos comunicarmos, durante meu período de férias no Canadá. E eu lhe contei
sobre o choro do cachorro. Ele foi do lado de fora para procurá-lo e para
retirar a neve que tinha-se acumulado na entrada. Não soubemos onde ele se
escondeu, só mais tarde voltamos a escutá-lo de novo. E encontramos, então, um
cãozinho franzino, desnutrido, apavorado e com um sinal de que tinha apanhado
de alguém. Ele parecia pedir ajuda, mas ao mesmo tempo se esquivava. Como
sempre temerosa, eu pensei que ele pudesse estar doente – raiva, talvez?
Pusemos um pouco de alimento lá fora e ele não demorou a se servir, longe da
nossa presença. Demos-lhe água e o fato de ele ter bebido sem constrangimentos afastou
a idéia de que pudesse ter hidrofobia, pelo menos.
E, assim, pouco a pouco, fomos nos
acostumando uns aos outros. Quando chegou o momento de retornar ao Brasil, eu
já estava quase me sentindo em família... E família com cachorro e tudo. Foi um
dos poucos cães dos quais eu perdi o medo, o nosso valente Ferócio.
Mas ele nunca quis deixar de ser “vira-lata”
e não se conformava em ficar somente no nosso terreno. Não abriu mão da sua liberdade. De vez em quando, sentia-se
bem à vontade para ultrapassar os seus limites e ia visitar a vizinhança, não
se sabe onde. Há suspeitas de que ele encontrara também uma namorada que lhe
agradava com toda a sua realidade.
Um dia, ele não voltou mais. Não
sabemos o que houve. Esperamos que tenha tido um final feliz.
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